Mães no celular, filhos "esquecidos"
O assunto, aliás, tem sido discutido no mundo inteiro, depois que uma foto viralizou e a mãe foi julgada ao extremo por manter um recém-nascido no chão de um aeroporto enquanto manuseava o celular (a história não é bem assim, como foi esclarecida posteriormente pela companhia aérea).
A verdade é que, com a infinidade de aplicativos disponíveis e as redes sociais cada vez mais presentes na vida das pessoas, é normal passar mais tempo em frente a dispositivos eletrônicos. Só que esse hábito pode ter um reflexo na criação dos pequenos.
"A falta de atenção dos pais pode gerar na criança problemas de autoestima, solidão e timidez. Em outros casos, desenvolvem-se quadros de agressividade e agitação em uma busca desenfreada por atenção. A dificuldade de relacionamento com outras pessoas e a busca constante por aceitação são outros sintomas possíveis", lista a psicóloga Andréa Duarte.
Ela ressalta, no entanto, que o celular não é sempre vilão. Ele pode ser usado para gravar brincadeiras, assistir vídeos juntos ou brincar em aplicativos de jogos, por exemplo.
O limite entre o saudável e o prejudicial está na interferência do uso do celular nas demais atividades do cotidiano e, principalmente, nas relações interpessoais.
"Quando estamos com o celular nas mãos, temos a falsa sensação de companhia. O grande problema está na necessidade constante de substituir o envolvimento real com outras pessoas pelo contato virtual", explica.
Mais comum do que se imagina, esse quadro de necessidade exagerada de ter sempre o celular por perto é um vício e já tem nome específico: nomofobia. "Nesse caso, a pessoa chega a apresentar crises de ansiedade quando afastada do aparelho", conta a especialista em família.
O vício não só prejudica o vínculo entre pais e filhos como projeta para a criança um exemplo negativo sobre relações interpessoais. "Pelo comportamento dos pais, a criança entende que as relações virtuais sobrepõem as relações reais", argumenta.
Isso não significa que devemos vilanizar toda mãe que deixa o filho brincar sozinho e aproveita para conferir as redes sociais. Julgamentos vazios não refletem a realidade de cada família.
"Os filhos não precisam ser supervisionados a cada instante e devem ir ganhando autonomia gradativamente, ao longo do crescimento. Uma checada rápida nas redes sociais não a torna a pior mãe do mundo", afirma a psicoterapeuta Marli Gonçalves, para quem existe uma cobrança social muito grande em cima dos pais.
Marli salienta ainda que o mais importante é entender que existe momento para tudo. "O tempo com a criança deve ter qualidade. Ela deve sentir que há um envolvimento total naquele momento, sem distrações", pondera.
Heavy user de redes sociais, a fotógrafa Letícia*, 32 anos, tinha o hábito de checar o celular a cada 10, 15 minutos. "A desculpa eram os e-mails de trabalho, mas eu ficava mesmo era olhando redes sociais”, admite. O baque aconteceu quando Marina, sua filha de 5 anos, lhe pediu um celular de presente de aniversário.
“Perguntei para quê ela precisava do aparelho e ela respondeu: 'Pra gente conversar mais. Eu vou poder te mandar mensagem e você vai responder na hora'. Aquilo que mostrou o quanto eu estava negligenciando a minha filha", revela.
Hoje, a mãe encontrou o equilíbrio e trabalha com horários específicos para abrir e-mails e aplicativos de mensagens. "Se estou com minha filha, me dedico 100% a ela. Para mim, o pouco tempo que passamos juntas tem que ser memorável", afirma.
* Nome alterado a pedido da entrevistada.
(Foto: Getty Images)